sexta-feira, 15 de março de 2013

Encontro às escura com Deus!




Por Hermes C. Fernandes

Recentemente o filho de um grande amigo meu nos Estados Unidos marcou um encontro às escuras (Blind Date, em Inglês). Nesse tipo de encontro (geralmente arranjado por um amigo, familiar ou agência de encontros), a pessoa "dá um tiro no escuro", isto é, sai para um encontro romântico com alguém desconhecido. Às vezes os amigos querem pregar-lhe uma peça, e dizem: Encontramos alguém que é a sua cara! Tomamos a liberdade de marcar um encontro entre vocês. E lá vai o coitado, acreditando que achará sua alma gêmea. Não sabe como é a aparência da pessoa, nem o que eles têm em comum. Se der certo, deu. Se não der, desse. Um fato agravante para o filho de meu amigo é que o tal encontro foi marcado num país do outro lado do mundo.

Qualquer coisa pode acontecer. Nem sempre as expectativas são alcançadas. Algumas agências fornecem fotos dos pretendentes acompanhadas de seus respectivos perfis. Porém muitas dessas fotos são retocadas em photoshop (do tipo, contra FOTOS não há argumentos, percebe?), e alguns dos perfis não expressam a verdade. Por isso, o risco de se comprar gato por lebre é enorme. Acho que as pessoas só aceitam esse tipo de encontro por causa da adrenalina, do tal "friozinho na barriga" que envolve a expectativa.

Surge, então, uma questão: até que ponto a igreja não tem se tornado uma espécie de agência promotora de "encontros às escuras" com Deus?

Ao que parece, "Deus" tem se tornado numa mercadoria altamente rentável. Antes se oferecia milagres em Seu nome, solução de problemas do mais variados, mas agora, descobriu-se que nada é mais atraente do que o próprio Deus. Então, por que não agenciar um blind date com Ele? Basta apresentá-Lo de uma forma atraente, como Aquele que é capaz de provocar sensações indescritíveis, emoções inesquecíveis. Você vai ficar apaixonado por Ele! Esse "deus" tá mais pra Dom Juando que para o Deus das Escrituras. Mas fique despreocupado, dizem eles. Garantimos sigilo absoluto. Aliás, você é que terá que garantir tal sigilo. Você não vai poder contar a ninguém o que passou lá (Porque se contar, estraga o marketing por trás da coisa, entende?) A única coisa que permitimos é que você use frases de efeito do tipo "foi tremendo!"

De fato, a curiosidade é a principal mantenedora desta indústria de encontros às escuras com Deus.

Veja a diferença entre esse "deus" Dom Juan, que apela ao sentimentalismo, e o Deus revelado em Jesus Cristo em Seu embate com as autoridades judaicas que O prenderam:
"Eu falei abertamente ao mundo. Eu sempre ensinei nas sinagogas e no templo, onde todos os judeus se reúnem. NADA DISSE EM OCULTO. Para que me interrogas? Pergunta aos que me ouviram. Certamente que eles sabem o que eu disse" (Jo.18:20-21).
Em outra oportunidade, Ele declarou aos Seus discípulos:
"...Nada há encoberto que não haja de revelar-se, nem oculto que não haja de saber-se. O que vos digo no escuro, dizei-o na luz; e o que escutais ao ouvido, pregai-o sobre os telhados" (Mt.10:26-27).
Portanto, o Deus das Escrituras não tem nada a ver com encontros às escuras. Paulo, o apóstolo dos gentios, reverbera o ensino de Jesus acerca do caráter claro e público exercido pelo ministério da Igreja de Cristo:
"...Rejeitamos as coisas que por vergonha se ocultam; não andamos com astúcia, nem falsificamos a palavra de Deus. Antes, recomendamo-nos à consciência de TODOS OS HOMENS, na presença de Deus, pela manifestação da verdade" (2 Co.4:2).
Já naquela época havia se introduzido no meio da igreja alguns mestres com heresias perniciosas que arrebanharam muitos incautos. Tal conjunto de heresias ficou conhecido como Gnosticismo. Todos os apóstolos combateram-no arduamente. Tais seitas eram cheias de mistérios, de encontros às escuras, com seus rituais de quebra de maldição, de cura interior, visões angelicais, ritos de iniciação, etc. Os gnósticos eram extremamente "espirituais", mas por trás de toda aquela fachada de espiritualidade havia lobos vorazes cheios de intenções inescrupulosas e inconfessáveis.

Havia também os judaizantes que queriam levar os cristãos de volta para os rudimentos da Lei. Esses queriam exercer domínio sobre os demais, proibindo-os de certas coisas, regulando suas vidas privadas. A esses Paulo diz: "Se estais mortos com Cristo quanto aos rudimentos do mundo, por que vos sujeitais ainda a ordenanças, como se vivêsseis no mundo, como : não toques, não proves, não manuseies? Todas estas coisas estão fadadas ao desaparecimento pelo uso, porque são baseadas em preceitos e ensinamentos dos homens. Têm, na verdade, APARÊNCIA de sabedoria, em culto voluntário, humildade fingida, e severidade para com o corpo, mas não têm valor algum contra a satisfação da carne" (Col.2:20-23). Na versão moderna deste tipo de legalismo, as pessoas são proibidas até entrarem na internet, às vezes sob o pretexto de se fazer um "jejum de internet", para que elas não tenham acesso à verdade e questionem tais práticas. Aos poucos, o jugo vai ficando insuportável. Até que, de duas uma, ou a pessoa cai fora e volta pro mundo, ou procura uma igreja séria, comprometida com a verdade, sem retoques.

Aquele "deus" apresentado como atraente, sedutor da alma, incomparável, vai se revelando um déspota, estraga prazeres, que só está preocupado em manter o controle. No início é só alegria, oba-oba, depois vêm as decepções. Jesus os denunciou dizendo: "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Percorreis o mar e a terra para fazer um convertido, e depois de o terdes feito, o tornais filho do inferno duas vezes mais do que vós" (Mt.23:15). O jugo colocado por esses mestres sobre os ombros dos seus seguidores é duas vezes mais pesados do que o jugo que trouxeram do mundo.

Pedro diz que esses mestres introduzem "encobertamente" heresias destruidoras. Por isso preferem o ambiente reservado, fora da igreja, onde tudo conspire em favor de suas dissoluções. E o pior é que "muitos seguirão as suas dissoluções, e por causa deles será blasfemado o caminho da verdade" (2 Pe.2:1-2). Pedro, então, desmascara suas reais intenções: "Por GANÂNCIA farão de vós negócio, com PALAVRAS FINGIDAS. Para eles o juízo lavrado há longo tempo não tarda, e a sua destruição não dorme"(v.3).

Uma coisa ninguém pode negar: a coisa dá certo! E sabe quem mais ganha com isso? É só reparar bem... Pena que haja tanta gente cega! Recomendo que leiam o capítulo inteiro de 2 Pedro 2. Você descobrirá, entre muitas coisas, que estes"desprezam as autoridades", são "atrevidos, arrogantes, não receiam blasfemar das dignidades" (v.10); "têm o coração exercitado na ganância"(v.14) e que eles "deixaram o caminho direito, desviaram-se" atrás do lucro (v.15); "proferem palavras arrogantes de vaidade, e nas concupiscências da carne engodam com dissoluções aqueles que estavam prestes a fugir dos que andam no erro. Prometem-lhes liberdade, sendo eles mesmo escravos da corrupção"(v.19).

Para os pastores que se sentem pressionados a adotar esse malévolo esquema de controle e lucro, recomendo que leiam a advertência de Pedro:
"Apascentai o rebanho de Deus, que está entre vós, tendo cuidado dele, não por força, mas voluntariamente, não por TORPE GANÂNCIA, mas de boa vontade; não como DOMINADORES dos que vos foram confiados, mas servindo de exemplo ao rebanho" (1 Pe.5:2-3).
O rebanho não necessita de quem lhes prive da liberdade. O aprisco não pode ser uma prisão. Os trabalhos promovidos pela igreja não devem ser uma arapuca, uma armadilha para os desavisados. Temos que "jogar limpo", revelando o caráter amoroso e justo do nosso Deus desde o começo, sem meias-palavras, sem emocionalismo barato e danoso à saúde mental.


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