Por Hermes C. Fernandes
Depois de dois cultos para lá de especiais, antes da bênção apostólica anuncio ao povo que eu, meu filho e um grupo de pastores da Reina (Pr. Cecílio, meu irmão, Pr. Rodrigo e Pr. Bruno) estaríamos no último show do Rock in Rio, prestigiando a um irmão em Cristo, Nicko Mcbrain, baterista da maior banda de Heavy Metal do mundo, o Iron Maiden. Pedi que os irmãos orassem por nós, já que estaríamos expostos a todo tipo de críticas. Nem precisei me dar o trabalho de ficar explicando o que faríamos lá. Graças a Deus, os irmãos da Reina já estão acostumados comigo e sabem que eu seria incapaz de me esconder atrás de uma justificativa mentirosa.
Confesso que estava muito cansado. O domingo foi, como sempre, de muito trabalho pastoral. Todavia, eu não poderia deixar de aproveitar os ingressos que um grande amigo nos conseguiu de graça. Afinal, esperei quase trinta anos para assistir à banda responsável pela trilha sonora da minha juventude.
Assim que chegamos ao local do show, surpreendi-me com o clima familiar. Tratava-se de um encontro de gerações. Avôs, pais e filhos se reuniam para ouvir sua banda predileta. Alguém disse que o Iron não tem fãs, mas fiéis. Não é uma modinha passageira, mas algo que se passa de pai para filho. Não encontrei um clima devasso, como alguns poderiam supor. Havia quem se exacerbasse um pouco, bebendo além da medida. Mas não precisa estar num show de rock para assistir a isso.
Quando vi aquela multidão, o primeiro comentário que fiz ao meu amigo Pr. Bruno foi que pareciam ovelhas sem pastor. Antes de começar o show, perguntava-me a mim mesmo o que fazer para alcançar aquela gente com o evangelho. A primeira coisa que me ocorreu foi que precisaríamos remover de nossa abordagem todo tipo de caretice.
Enquanto transitava por entre a multidão, pensei: - Como posso estar aqui sem julgar quem quer que seja? Como posso enxergar-me como um deles, tão carente quanto qualquer outro da graça divina?
Das várias cenas que assisti, talvez a que mais me chamou a atenção foi a de um senhor cadeirante que não conseguia ficar parado durante as apresentações, fazendo manobras com sua cadeira de rodas, celebrando o fato de estar vivo.
Pr. Bruno Jardim, Pr. Cecílio, bispo Hermes, Rhuan e Pr. Rodrigo
Resolvi, então, partilhar com meus amigos do facebook aquele momento tão importante para mim. Bastou que postasse duas fotos para que surgissem as mais inusitadas reações. Houve quem me acusasse de estar levando para o inferno todos que me seguem. Em pouco tempo, perdi vários seguidores (ao menos oito, num universo de cinco mil).
Alguém me perguntou se minha presença ali tinha objetivo evangelístico. Para muitos, esta seria a única razão que justificaria que um ministro do evangelho estivesse num show de rock. A verdade é que eu estava ali para me divertir ao lado do meu filho e dos meus companheiros de ministério. Curti cada canção do Iron. Foi como tomar um elixir da juventude.
Como me arrependo de ter quebrado todos os meus discos do Iron assim que ingressei no ministério. Que mal faz o legalismo! Mas pelo menos, minha esposa se libertou dos Menudos...rs
Tenho sérias dificuldades para entender as razões pelas quais alguns cristãos abominam o tipo de performance do Iron. Será que não percebem tratar-se de dramatização? Então, por que assistem a filmes de terror? Por que conceder licença poética ao cinema, ao teatro, aos livros, mas não à música?
A maioria sequer se deu o trabalho de examinar as letras bem trabalhadas da banda. Algumas falam de demônios, 666, mas sempre em tom irônico ou crítico. O Iron é uma das poucas bandas de rock que não fazem apologia às drogas e ao sexo livre. Bruce Dickinson , seu vocalista e principal compositor é professor de história e, nas horas vagas, piloto de avião.
Eu poderia ter levado folhetos evangelísticos para distribuir ali, mas será que funcionaria? Talvez eu pudesse usar isso como álibi ou mesmo para driblar minha consciência. Mas, sinceramente, seria inútil. Em momento algum minha consciência se viu violada.
Para mim, o ponto alto do show foi quando os Irons tocaram “I’m running free”. Ali estava a graça de Deus revelada numa canção de Heavy Metal. Ocorreu-me, imediatamente, a passagem em que Paulo declara: “Foi para a liberdade que Cristo nos libertou.”
Ao decidir escrever este post, pensei em apresentar razões teológicas para estar naquele show. Lembrei-me, por exemplo, de Mesaque, Sadraque e Abedenego que estavam presentes naquela convocação do rei, e ao ouvirem a música, não se prostraram diante daquela escultura. Apesar de ter sido uma convocação, Daniel parece não ter atendido. Ou então, teremos que admitir que ele se prostrou. Todavia, cheguei à conclusão que seria um desperdício de tempo tentar me justificar. Parafraseando Paulo, quem não iria a um show de rock, não julgue quem o faça, e quem foi, como eu, não julgue quem jamais iria. O que autentifica nossa fé não são os ambientes que frequentamos, mas o amor que revelamos em qualquer lugar.
Em pleno Rock in Rio, eu e meus pares não fizemos proselitismo, não exibimos camisetas com dizeres evangelísticos, mas buscamos encarnar o evangelho, amando cada pessoa, sem julgá-la ou enxergá-la de cima para baixo.
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