Quando Jesus disse que o “reino de Deus” ou o “reino dos céus” seria semelhante a [...] uma semente pequena que cresceria; ou como um fermento imperceptivelmente penetrante; ou como um tesouro escondido no campo; ou como uma pérola de grande valor, porém não disponível aos sentidos de todos; ou como uma candeia que iluminaria a todos os que estivessem na casa; ou ainda como o sal da terra — Ele apresentava, também, ao assim dizer, o paradigma do que a Igreja [a Dele] deveria ser como expressão visível do reino de Deus na comunidade humana.
Desse modo, as ênfases de Jesus são aquelas ligadas ao pequeno que cresce naturalmente a fim de acolher... [semente/árvore]; ao que tem como poder a pervasividade discreta [fermento]; a um valor indizível e que é conhecido apenas por quem o venha a conhecer em seu real significado [a pérola]; a uma riqueza escondida dos olhos de todos, e que não é objeto de propaganda [o tesouro oculto]; a uma luz para os da casa [a candeia; que ilumina a muitos se aumentarem as casas com sua luz no interior]; e à qualidade de gosto da presença dos discípulos, com poder de dar gosto divino onde estejam [o sal da terra].
Ora, em nenhuma dessas coisas a ênfase está na grandeza, na publicidade, na promoção ou na propaganda!
Ao contrário, a ênfase está na naturalidade do crescer, na pervasividade e na penetração decorrente de ser, no significado intrínseco da coisa em si, na sobriedade oculta de tal poder, que fascina por não ser massificado; na iluminação de grupos pequenos, como numa casa, e que altera primeiro os de dentro, e, aumentando o número de casas/povo iluminados, se faz visível ao mundo; e, sobretudo, a ênfase recai na qualidade essencial da natureza existencial dos discípulos, os quais, à semelhança do sal, podem dar sabor à vida dos que os cerquem, pelo fato de que eles têm tal gosto/sabor/qualidade em si mesmos.
Agora, compare isto com os modelos de “igreja”. Sim; com a ênfase na propaganda, no mercado, nos nichos, na promoção, no show da fé, na massificação sem rosto, no crescimento quantitativo, na artificialidade dos modelos de crescimento piramidal; ou ainda: compare com a venda do “Evangelho” como produto de salvação; sempre para fora; sempre para o mercado; sempre segundo a Coca-Cola, ou a Pepsi, e nunca segundo Jesus; o Qual, entre nós, fazia tudo com discrição, sem o afã das promoções; e que mais que frequentemente, pedia que Dele não se fizesse propaganda, ou que se O expusesse à publicidade; posto que Seu modus operandi cumprisse a profecia que dizia: “Nas praças [Ele] não fará ouvir a Sua voz!”
O que isto significa? Que não se pode fazer propaganda de Jesus?
Sim; significa isto mesmo!
O Jesus propaganda é o Jesus do Mercado; é o Jesus do Bazar; é o Jesus da Venda; é o Jesus do Mundo!
Na realidade se diz que “a fama de Jesus corria por toda parte” e que “as multidões vinham ouvi-Lo de todos os lugares”.
Todavia, isso acontecia porque acontecia; porque era verdade; porque não se consegue esconder a luz; porque se o sal for jogado na terra nota-se a diferença pelo sabor; porque se a semente virar árvore as aves dos céus a encontram com naturalidade; porque o achar da “pérola de grande valor” faz aquele que a acha sair alegre com tal descoberta; porque o “tesouro escondido no campo”, uma vez que nele se tropece, faz o achador vender tudo e comprar o campo, a qualquer custo ou preço, tornando qualquer esforço apenas um ganho, uma alegria!...
Assim deveria crescer o “reino de Deus” entre os homens; e assim deveria ser com a Igreja dos discípulos de Jesus como expressão do “reino de Deus” na História.
Ora, isto faz sentido com a lógica de Jesus em tudo; embora difira radicalmente das lógicas humanas!
Sim; pois foi Jesus Quem disse que o grão de trigo tem que morrer a fim de dar muito fruto; que aquele que busca se salvar, perde-se; que aquele que morre, vive; que aquele que se humilha, será exaltado; e que é o pequeno que se faz grande!
O problema é que desde os apóstolos [...] pensar diferente sempre foi uma tentação. Tiago mesmo se vangloriava de ter “milhares e milhares com ele em Jerusalém”, e também que um grande número de sacerdotes do judaísmo [...] eram cristãos “zelosos da Lei de Moisés”.
Paulo parece ser o exemplo a ser seguido entre os apóstolos como aquele que não desistiu jamais do paradigma de Jesus; sem surtos de tomadas de cidades; sem querer erguer nada no Areópago; sem pretender nada além de ir plantado sementes de igreja nas casas; sem buscar conluio com autoridades das sinagogas; sem falsas expectativas —; enquanto, assim procedendo, em nenhum outro tempo apostólico [...] as coisas geravam mais bulício, produziam mais impacto nas cidades, alvoroçavam mais o mundo!
A Igreja que revolucionou o 1º e o 2º Séculos foi a de Paulo, não a de Tiago, a qual tinha Jerusalém como modelo!
Do 4º Século em diante, todavia, houve uma fusão do modelo de Jerusalém [o de Tiago] com o paganismo cristianizado, miscigenado, sincretizado, politizado e cooptado pelo Imperador Constantino.
Sim; esse é o modelo que vige até aos nossos dias!
Até mesmo o Protestantismo das raízes mais bem intencionadas se serviu dos aparatos que o Catolicismo havia produzido; como, por exemplo, os grandes prédios de culto ao estilo romano; os modelos oficiais de sacerdócio; as hierarquias de autoridade; a oficialidade dos sacramentos; a liturgia do culto; o oráculo procedente de oficiais; os vínculos com as realezas; o conluio com os principados políticos; e, consequentemente, com a propaganda e o mercado.
Assim, a Igreja casa [grão de mostarda] deu lugar à “igreja” Catedral; a Igreja fermento deu lugar à “igreja” da influencia; a Igreja do valor intrínseco deu lugar à “igreja” do intrínseco valor da propaganda; a Igreja do tesouro oculto deu lugar à “igreja” das promoções de poder.
Ora, é por isto que nos últimos 1700 anos a “igreja” teve todos os poderes do mundo na mão, mas o mundo apenas piorou! — sem falar que a Igreja de Deus teve que se ocultar ainda mais nas sombras da “Igreja dos Homens” ou até fora dela!
Desse modo, afirmo que faz milênios que o mundo não assiste ao que possa ser a verdadeira revolução da Igreja; sim, desde os dias em que gente como Paulo praticava a grandeza do pequeno; seguia a fermentalidade subversiva do oculto; celebrava com bravura feliz o achado de grande valor para o coração; e a criação de uma rede de amantes de Deus guiados pela leveza da Palavra apenas — em casas, em bosques, em pequenos grupos, em porões, em jardins particulares, em lugares públicos abandonados, etc... — sim; desde aquele tempo o mundo não viu mais o poder subversivo e sem dono humano da Igreja de Deus!
A revolução da Igreja no mundo decorre de sua disposição de ser não-proprietária; de ser hebreia na leveza peregrinante dos seus movimentos; de ser discreta e prática nas suas obras de amor; de ser o mais livre possível dos poderes constituídos deste mundo; de ser uma comunidade de amor, que se reúne para compartilhar a Palavra, orar, adorar e ajudar-se mutuamente; enquanto vive o testemunho do Evangelho em serviço de amor no mundo.
Se um dia essa Igreja reaparecer em grande escala de multiplicidade não adensada; se ela ressurgir na subversão de ser sem a propaganda de aparecer em outdoors; se ela ressurgir como agente ocultamente visível apenas por suas obras de generosidade e graça; se ela emergir como sombra simples que decorre da sua própria natureza; e se seu gosto for renovado pela qualidade existencial dos seus agentes — então, outra vez, sem que isto decorra de um plano ou de uma estratégia, mas da mera expressão da própria natureza de ser desse ente santo, o mundo tremerá sem saber nem de onde vem o abalo.
Nós, todavia, fomos ensinados pelo diabo que isto é morte, é fraqueza, é moleza, é perda de poder, é desistência de status, é suicídio, é entrega do que se conquistou ao mundo; é coisa de maluco; sim; de gente que perdeu a visão, perdeu a ambição, perdeu o espírito profético.
Sim; diante disso o diabo diz à “igreja”: “Jamais! Isto de modo nenhum te acontecerá, Senhora!”
Ao que Jesus continua a responder: “Arreda de mim, Satanás; pois para mim tu és pedra de tropeço!”
Eu, porém, sei que grito no deserto; sei que sou lido como louco; sei que tais palavras são consideradas insanidades; sei que não serei ouvido; embora, em meu coração, saiba também que aqui e ali uns poucos me entendam; e, assim, eu julgue que pela conversão de alguns [...] o que hoje seja horrível, possa ser de um modo ou de outro melhorado; ou, pelo menos, possa, em acontecendo em que escala possa acontecer [...], suscitar, emular ciúmes na “Israel/Igreja/Pedrada” — usando os pensamentos de Paulo em Romanos 9,10 e 11.
Nele, em Quem tenho a consciência tranquila quanto a nunca ter deixado de dizer o que Igrejaé para Jesus,
Caio
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