Por Hermes C. Fernandes
"Ai deles! Entraram pelo caminho de Caim..." (Judas 11a).
"O caminho de Caim" é a rota de colisão entre o homem e Deus, e entre o
homem e seu semelhante. O Caminho ( que é Cristo! ) proposto pelo
Evangelho é o do encontro, da reconciliação entre o Criador e a
criatura, e entre o homem e seu próximo.
Tanto a colisão quanto o encontro são frutos de uma
convergência entre pontos. A diferença é que no encontro as partes se
integram, se unem, e às vezes se fundem. Já a colisão tem efeitos
colaterais devastadores. As partes se chocam, produzem atrito, e às
vezes se esfacelam.
O texto bíblico diz que Caim irou-se por achar que Deus não atentara
para sua oferta, como para a oferta de seu irmão Abel. Esse
descontentamento foi fruto da comparação. - Por que ele, e não eu?
Toda inveja/ciúme é fruto da comparação. Quando nos
comparamos uns com os outros, temos a tendência de achar que somos
injustiçados, preteridos, e que, de alguma maneira, nossos direitos
estão sendo lesados. Daí vem o senso de justiça própria.
O invejoso é aquele que acusa Deus de agir com injustiça, por
preferir uns, e preterir outros. Mas a Bíblia é clara ao dizer que para
Deus não há acepção de pessoas.
Abel não era o favorito de Deus, como insinuava Caim. Suas ofertas eram
aceitas porque eram feitas com o coração puro, sem a pretensão de
desbancar seu irmão. Já as ofertas de Caim tinham a marca da presunção.
Infelizmente, muitos que se dizem cristãos parecem ter se matriculado na
escola de Caim. Até testemunhos são dados com a intenção de demonstrar o
quanto são importantes para Deus, em detrimento de seus irmãos. Acham
que dar testemunho é contar vantagem, se cartar, instigando seus irmãos à
inveja. - Vejam, vocês não têm a fé que eu tenho.
Esse espírito de Caim tem sido estimulado até dentro dos lares, onde os filhos disputam a atenção e predileção dos pais.
As Escrituras nos advertem a não sermos como Caim, "que era do maligno, e matou a seu irmão. E por que o matou? Porque as suas obras eram más e as de seu irmão, justas" (1 Jo. 3:12).
A existência de Abel se tornou uma afronta para Caim. Por isso, ele não
hesitou em matá-lo. Convidou-o para um passeio no campo, e quando seu
irmão se distraiu, apunhalou-o pelas costas, cometendo o primeiro
homicídio narrado pelas Escrituras.
Talvez não tenhamos a coragem que ele teve de tirar a vida do próprio
irmão. Mas se nutrimos um sentimento de ódio, alimentado pela inveja e
pela justiça própria, aos olhos de Deus somos tão homicidas quanto Caim.
"Todo que odeia a seu irmão é homicida..." (1 Jo.3:15a). E esse
instinto homicida, uma vez nutrido, pode nos levar a matar nosso irmão,
pelo simples fato de sua existência se nos tornar numa afronta.
Há muitas formas de "matar" alguém. Podemos matá-lo à prestação, usando
nossa língua como arma. Podemos matá-lo ao privá-lo de seus direitos.
Podemos interditar seus sonhos, boicotá-lo com nossos comentários
maldosos, ou simplesmente ignorá-lo.
O Caminho de Caim é o caminho do ódio, do extermínio, que busca se
auto-justificar alegando ser vítima de uma injustiça. Já o Caminho de
Cristo é o caminho do amor, que em vez de tirar a vida, se oferece para
dar a vida, sem qualquer pretensão de ser recompensado.
"Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós. E devemos dar a nossa vida pelos irmãos" (1 Jo.3:16).
O amor faz cessar toda contenda, toda demanda, toda reivindicação. O
foco deixa de ser nossos direitos, para ser o bem-estar de nosso
semelhante.
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