Conversava
com minha mãe hoje cedo, quando ela me disse algo que eu sempre senti e
quase nunca expressei, a saber: que as pessoas de antes, no tempo dela,
e, também, no tempo quando nasci, ficavam velhas bem cedo.
Ela
falava de uma amiga dela, velha jovem de alma e corpo, que, aos 79
anos, andava serelepe com minha mãe e a filha, esta, grande amiga de
minha mãe, quando, sem mal algum, com a pressão de criança, com tudo em
cima, amanheceu morta diante da televisão, levada por um súbito ataque
cardíaco.
Eis o que mamãe disse depois de muito falarmos sobre a querida amiga dela:
“Antigamente
as pessoas ficavam velhas com cinqüenta anos. Aos sessenta se era
idoso. Conheci sua avó Zezé quando ela tinha 50 anos. Morreu aos 79, mas
já era muito velha desde cedo. Eu tenho 81 e me sinto jovem. O problema
é o corpo. Mas se não fosse isso, eu estaria muito jovem ainda”.
Então
lembrei das filhas da minha avó paterna, minhas tias queridas. Todas
envelheceram sem ficar velhas também. Quase todas enviuvaram, mas não se
enterraram com seus maridos. Deram-se aos filhos e netos.
Muitas vezes me parece que a geração de papai e mamãe foi melhor do que a minha e do que a de seus pais.
Recordei
ainda que quando eu era menino as pessoas morriam por muitas razões.
Quase tudo matava. A idade média do amazonense nos anos 50 era de pouco
mais de trinta anos de idade. Hoje a idade média no Amazonas beira os 70
anos.
Um
jovem de trinta anos hoje, que muitas vezes não casou e não saiu de
casa, ainda que trabalhe, sente-se um menino, enquanto, a mesma pessoa,
50 anos antes, sentir-se-ia esmagado por responsabilidades, e
preocupava-se com a aposentadoria mais do que com lazer, viagens ou
aquisições.
É uma pena que tal “longevidade” não se faça acompanhar do carnegão que antes existia nas pessoas.
Hoje
todos são muito fracos e imaturos. As exceções, em geral, acontecem
apenas entre os mais pobres. No entanto, falando do todo, o que se tem é
que esta geração é fraca.
Sim!
Sabem muita coisa, mas são insensatos. Fazem muitas coisas, mas
realizam quase nada. Pensam em dinheiro, depois em ter filhos. Antes se
pensava em ter filhos, e, então, se corria atrás do dinheiro. Se
houvesse alguma separação conjugal, coisa muito rara, a mulher e os
filhos tinham prioridade em tudo. Não era uma questão de leis, mas de honradez. Hoje se discute na justiça. Têm-se leis, mas não se tem humanidade.
Antes
os filhos tinham prazer em ajudar os pais, mesmo que eles nada
precisassem. Era uma honra, um privilégio. Hoje, os filhos se penduram
nos pais e se fazem de crianças debiloides até quando seja possível.
O
que se tem cada vez mais hoje é uma geração de longevos idiotados e
musculosos, mas sem tutano no ser, sem perseverança, sem alegria
não-estimulada, sem um olhar limpo; antes, sempre angustiado, sempre
sôfrego, sempre afetivamente carente, sempre quase em depressão, sempre
correndo, sempre sem tempo, sempre eles, quase ninguém mais.
Mas, como disse antes, vejo que a minha geração é mais fraca de caráter e disposição do que a de meu pai.
Meu
pai, todavia, é uma exceção. Até aos oito anos de idade ele se
arrastava pelo chão, pois, com 1 ano, teve paralisia infantil e perdeu
os movimento da perna direita. Tudo para ele era muito difícil. Mas
brincava. Jogava bola no gol ou na defesa. Fazia barra e se exercitava
muito com os braços. Ficou muito forte e musculoso. Amava ver os outros
divertirem-se. Seu maior lazer, no entanto, era a leitura. Aos 18 foi
incumbido pelo pai, que morria lentamente, de cuidar dos negócios da
família, pois, os demais irmãos homens estavam estudando fora do
Amazonas. Viajava 15 dias de ida e 15 de volta. Às vezes ficava semanas
na beira de um rio esperando o batelão chegar para resgatar a borracha e
a castanha. Sem uma alma a milhas de distancia. Sozinho. Com chuva.
Muita chuva e mosquito carapanã. Queixadas, porcos do mato, o cercavam
querendo comer a castanha. Ele os enxotava noites e noites a fio. Cursou
todo o curso de Direito passando suas férias no Seringal. Namorou por
carta durante quase dois anos. Aprendeu a esperar, a ficar só, a
aguardar as estações.
Eu,
de minha parte, só vi televisão aos 10 anos de idade, mas, nunca mais
fui o mesmo. Até aos 18 foi uma loucura só. Embora, aos dezoito, ao me
converter, da noite para o dia tenha virado homem. E foi assim desde
então. Mas, estou longe de ter aprendido a paciência natural que
norteava meu pai. Hoje busco crescer nas coisas que nele pareciam parte
de tudo.
Quanto mais facilidades, mais fragilidades!
Quanto mais expectativa de longevidade, mais retardo!
Quanto mais instantaneidade, mais impaciência!
Quanto mais cellular, menos tutano!
Quanto mais computador, mais com puta dor!
Quanto mais fora, menos dentro!
Sempre foi assim. Hoje, porém, tais coisas são ambições de todos, e, assim, essa é a fraqueza geral.
O que fazer?
Impor dificuldades a fim de obter bons resultados?
Não! Pais têm que ajudar os filhos sempre, mas sem que a ajuda os retarde.
E mais:
Se
você é desta geração virtual, sem mangueira no fundo do quintal, então,
salve-se disso buscando saber que um homem é homem quando nasce, e que a
fase de menino deve começar a acabar com os sinais de maturação do
corpo.
Antigamente
a relação entre maturidade física e psicológica era natural. Hoje o
homem de 35 anos já tem fios brancos no cabelo, mas vive como um eterno
adolescente na idade.
As
mulheres casam tão tarde que não raramente precisam de ajuda médica
para escolher um bom óvulo. Antes elas tinham filhos um pouco depois de
fisicamente os poderem ter, e, também, os tinham com facilidade, e os
criavam com alegria. Era um privilegio.
Para mim, no entanto, nessa área, o que há de mais feio é uma velha assanhada e sem noção.
Sim!
Velhinhas que não querem ser chamadas de avó, pois, depõem contra.
Velhinhas que escondem a idade. Velhinhas que não podem ver um homem.
Velhinhas sem amor. E velhinhos também. Tudo igual para quem sente. Mas
para quem vê, parece que na mulher além de ridículo, é ainda um perder
da própria natureza.
Para
alguém pode parecer apenas um falar careta. Mas creia, não é. E, além
disso, também não é um falar de alguém com saudade de nada, a não ser do
bem de ser bem humano, e que hoje se torna algo cada vez mais raro.
Digo
o que digo visando a busca de força e saúde para a alma, pois, os dias
adiante de nós serão dias muito maus, e não serão próprios para esta
Geração Algodão Doce.
O
ideal é que se seja longevo, resistente psicologicamente, e maduro
conforme a idade cronológica. E mais ainda: que, sendo assim, sejamos
também dotados de alegria séria e de séria alegria, como era com eles,
os que hoje já nos são apenas grata memória.
Caio
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