Por Hermes C. Fernandes
H.G.Wells foi um grande gênio, criador do gênero literário de ficção científica. Foi ele que em 1898 imaginou como seria alterar um planeta a fim de torná-lo habitável. Em seu livro “A Guerra dos Mundos”, extraterrestres invadem a Terra, derrotam a civilização humana e iniciam um processo de terraformação, preparando-a para ser colonizada por sua raça. Recentemente, o filme “O Homem de Aço” utilizou a mesma argumentação. O general Zod e seus asseclas pretendiam transformar nosso planeta num novo Kripton.
Terraformação é a denominação dada ao processo de modificar a atmosfera,temperatura, e geologia de um corpo celeste sólido (como um planeta ou um satélite natural) até deixá-lo em condições adequadas para suportar um ecossistema com seres vivos da Terra. A maior parte do que se sabe sobre a modificação de planetas é baseado no que já observamos em nosso próprio mundo. Os efeitos da poluição sobre o ecossistema de nosso planeta evidenciam que é possível afetar o ambiente em uma escala global a fim de transformá-lo, ainda que esse processo possa ser muito lento. Os cientistas concordam que Marte seja o candidato mais provável para as primeiras experiências em terraformação. A NASA, agência espacial americana, estuda maneiras de aquecer o planeta e de alterar a sua atmosfera, possibilitando uma eventual colonização humana.
Deixando o campo da ficção científica para o campo da teologia, o que muitos cientistas desconhecem é que nosso planeta já passou por uma terraformação, e que, esta se encontra registrada no livro de Gênesis. Ali somos informados de que “a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo, mas o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas” (Gn. 1:2). Interessante notar que o verbo hebraico traduzido por “pairar” é o mesmo usado em referência ao ato de chocar, próprio das aves. Este verbo aparece em Deuteronômio 32:11, onde lemos: “Como a águia desperta a sua ninhada, paira sobre os seus filhotes, estende as suas asas, toma-os, e os leva sobre as suas asas.” O Espírito de Deus estava, por assim dizer, chocando as águas, preparando o caldo primordial de onde a vida emergiria na Terra. Por isso se diz longo adiante no texto de Gênesis que a ordem de Deus foi para que as águas produzissem a vida. E aqui, ciência e fé se harmonizam, pois ambas concordam que a vida surgiu da água.
O salmista tem um vislumbre da atuação criadora do Espírito Santo ao declarar:“Quando envias o teu Espírito, são criados, e assim renovas a face da terra”(Sl.104:30). Repare numa coisa importante que esta passagem nos revela. O Espírito não apenas é responsável pela criação e manutenção da vida, mas também pela renovação da face da terra. O processo de terraformação não está acabado. A Terra prossegue em sua renovação contínua. Placas tectônicas são acomodadas. Continentes vão se distanciando uns dos outros alguns centímetros por ano. O nível do mar aumenta em algumas regiões. O que antes era floresta torna-se deserto, e vice-versa. Animais migram. Espécies desaparecem. Vulcões entram em erupção. Aterros são retomados pelas águas do oceano. Enfim, a Terra está em constante mutação.
Em que pese o papel do homem na alteração da paisagem e do clima (seja para o bem ou para o mal), o fato é que, mesmo antes de ele ter aparecido, a Terra já havia sido cenário de várias extinções em massa. Se os dinossauros não houvessem sido extintos, os mamíferos não teriam se desenvolvido e a Terra não seria capaz de abrigar a raça humana. Quero dizer com isso que as coisas não aconteceram à revilia. O Espírito Santo guiou todo o processo, tenha durado seis dias literais ou bilhões de anos como defende a ciência. Este processo todavia não terminou. Uma nova terra está a caminho. Não será outro planeta, como acreditam alguns, mas a nossa terra completamente reformatada, pronta para ser habitação da nova humanidade.
A criação da nova terra é um processo que se dá concomitantemente à criação da nova humanidade. Porque esta nova terra deverá ser habitação da justiça (2 Pedro 3:13). Portanto, compete ao mesmo Espírito produzir esta nova raça de seres humanos, dotados de uma consciência comprometida com a justiça.
Jesus anunciou-nos que o Consolador por Ele enviado convenceria o mundo “do pecado, e da justiça e do juízo” (Jo.16:7-8). A renovação da mente, sem a qual não podemos experimentar qual seja a boa, perfeita e agradável vontade de Deus, passa necessariamente por estes três estágios. Sem que sejamos convencidos do mal (pecado), não poderemos experimentar o bem. Sem que sejamos convencidos acerca da justiça, não provaremos o que é perfeito. Perfeição tem a ver com integridade, inteireza, justiça. Se não formos convencidos acerca do juízo, também não experimentaremos a agradável vontade de Deus. O mesmo Espírito que renova a face da terra, também almeja renovar nossa consciência, reformatando-nos, transformando-nos segundo a imagem do Filho de Deus, Jesus (2 Co.3:18). Se a nova terra fosse habitada pela velha humanidade, esta a destruiria como está fazendo com a atual.
Há três elementos usados como símbolo da ação do Espírito Santo em Sua interação com a terra e seus habitantes: água, vento e fogo.
Todos os três são responsáveis pelo processo que os geólogos chamam de erosão, através do qual a topografia da terra está em permanente transformação. A ação desses elementos serve-nos como analogia da ação do Espírito Santo na transformação da sociedade.
Esta analogia é proposta pelas próprias Escrituras em várias passagens, dentre as quais destaco a que se segue:
“Não vos lembreis das coisas passadas, nem considereis as antigas. Eis que faço uma coisa nova, agora sairá à luz; porventura não a percebeis? Eis que porei um caminho no deserto, e rios no ermo.” Isaías 43:18-19
É claro que Deus não está falando de um fenômeno geológico ou ambiental, mas usando-o como analogia da obra que Seu Espírito promoveria entre os homens. Algo novo já estava em andamento, todavia, ninguém se apercebera. Assim se dá com o processo de erosão. Algumas vezes acontece abruptamente, como quando ocorre um terremoto ou tsunami. Mas geralmente, acontece imperceptivelmente. Por isso os geólogos falam de “eras geológicas”. O que para nós, humanos, representa um tempo incalculável, geologicamente não passa de um momento.
Vamos verificar a ação de cada um dos elementos que representam a atuação do Espírito em convencer-nos do pecado, da justiça e do juízo:
1. Água
Observe como as águas açoitam as rochas na praia. Pode parecer que as pedras estejam resistindo bravamente. Mas, em longo prazo, cumpre-se o adágio que diz: água mole em pedra dura, tanto bate até que fura! Não só fura, mas a esfarela. De onde vêm a areia da praia, afinal? Não vêm das rochas esfareladas pela ação contínua da água? Sem embargo, águas transformam pedras em areia. De modo semelhante, o Espírito Santo transforma “pedras” em filhos de Abraão. Para o judeu contemporâneo de Jesus, os gentios não passavam de pedras. Jesus desafiou a sua presunção ao declarar: “mesmo destas pedras, Deus pode suscitar filhos a Abraão”(Mateus 3:9). Ora, era sabido de todos que a promessa feita por Deus a Abraão era que sua descendência seria “como a areia que está na praia do mar” (Gn.22:17). Como transformar pedras em areia? Como transformar gentios pagãos em filhos de Abraão? Através da atuação do Espírito Santo. Sim. Porém, o instrumento usado por Ele para isso é a Palavra. Ela é “como um martelo que esmiúça a rocha” (Jer.23:29).
Mesmo antes que estas pedras se transformem em grãos de areia, o Espírito desperta nelas o desejo de clamar. Jesus disse que se nós nos calássemos, conformando-nos ao atual estado de coisas, “as pedras clamarão” (Lc.19:40). Clamarão reconhecendo seu pecado, e o pecado da sociedade na qual estão inseridos. Clamarão por perdão e serão salvos. Clamarão por justiça e serão fartos.
As águas também são condutores de vida. O caminho do pecado conduz à morte. Mas a vereda do Espírito conduz à vida. De acordo com a visão de Ezequiel, há um rio cuja nascente é o templo de Deus, mas cujo destino é desaguar no mundo. Apesar de alegrar “a cidade de Deus”, não temos o direito de represar suas águas. Pois “onde quer que este rio passar tudo viverá” (Ez.47:9). Seu objetivo é irrigar cada área de nossa existência, tornando fértil a terra seca. A cultura, a ciência, o governo, a família, são algumas dessas áreas que necessitam ser irrigadas pelas águas do Espírito.
Além de esfarelar rochas, transformando-as em areia, de conduzir vida por onde passa, as águas do Rio de Deus também nos lavam e purificam de todo resquício do pecado (1 Co.6:11).
2. Vento
O segundo elemento responsável pela erosão é o vento. Quando o Espírito Santo desceu sobre os discípulos reunidos no cenáculo, ouviu-se um ruído “como que de um vento impetuoso” (At.2:2). Foi este vento o responsável por espalhar o que, até então, estava restringido a um grupo fechado. Por isso, os discípulos “ficaram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas”(v.4). Era importante que os estrangeiros reunidos em Jerusalém para celebrar a festa de Pentecoste tivessem a oportunidade de ouvir o evangelho em seus próprios idiomas. Basicamente, é isso que o vento faz: espalha. Daí sua importância no processo de erosão. Ao espalhar, ele distribui o que estava concentrado num único lugar.
Consideremos, por exemplo, as montanhas. Como se formaram? Ao longo de eras geológicas. Cada montanha é um acúmulo de terra e outros materiais. Cada vez que o vento sopra sobre ela, parte deste material é distribuída, e assim, a paisagem é remodelada. É claro que não acontece da noite para o dia. Mas de uma coisa podemos estar certos. Está acontecendo agora mesmo.
Veja o que diz o Senhor pelos lábios de Isaías:
“Todo o vale será exaltado, e todo o monte e todo o outeiro será abatido; e o que é torcido se endireitará, e o que é áspero se aplainará. E a glória do SENHOR se manifestará, e toda a carne juntamente a verá, pois a boca do SENHOR o disse.” Isaías 40:4-516:7-8
Exaltar o vale e abater o monte é uma metáfora para o estabelecimento da justiça do reino. Não é justo que uns tenham tanto, e outros tão pouco. Toda concentração de bens constitui-se numa injustiça (Is.5:8), e devemos priorizar não somente o reino de Deus, como também a sua justiça. Quando o vento do Espírito sopra, há uma redistribuição de riquezas. O terreno acidentado é nivelado. Tira-se da montanha para aterrar o vale. Como disse Paulo: “Espalhou, deu aos pobres, a sua justiça permanece para sempre” (2 Co.9:9). Não foi isso que aconteceu na igreja primitiva? O resultado da ação daquele vento impetuoso não foi só o falar em línguas, mas também o tornar “um o coração e alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comum”(At.4:32).
Ao convencer-nos da justiça, isto é, do que é justo, o Espírito de Deus nos faz converter-nos ao nosso próximo, buscando atender às suas necessidades com aquilo que nos tem sido confiado.
3. Fogo
Dentro do simbolismo bíblico, fogo representa juízo. O fogo é, sem dúvida, a mais poderosa ferramenta de erosão disponível na natureza. Basta observar a fúria de um vulcão em erupção para verificar o que digo. A lava que escorre da montanha nada mais é do que rocha derretida. O que a água não houver esfarelado, o fogo certamente derreterá. Ninguém fica imune à ação do fogo. Nada é capaz de resisti-lo. O mesmo pode-se dizer do juízo divino.
Na visão do trono de Deus narrada pelo profeta Daniel, “um rio de fogo manava e saía de diante dele (...) Assentou-se para o juízo, e os livros foram abertos” (Dn. 7:10). Se para o justo, aquele é um rio de água viva, para o ímpio é um rio de fogo, semelhante à lava expelida por um vulcão.
Pedro nos adverte que o dia do juízo surpreenderá a muitos, quando “os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra, e as obras que nela há, se queimarão” (2 Pe.3:10). Não creio que devamos fazer uma leitura literal deste texto, como se o planeta em que vivemos estivesse fadado a ser incinerado. Trata-se, antes, de uma poderosa metáfora para o juízo reservado à todos os que resistiram à ação da água e do vento durante as inúmeras oportunidades dadas por Deus.
Judas diz que o Senhor virá “com os seus milhares de santos, para executar juízo sobre todos e CONVENCER a todos os ímpios de todas as obras de impiedade, que impiamente cometeram” (Jd.1:14-15).
Se não nascermos da água, recusando-nos a sermos “instrumentos de justiça”, só nos restará sermos alvos do juízo de Deus.
Deus está redesenhando a geografia do mundo. Um novo mundo emerge diante dos nossos olhos: Um novo céu e uma nova terra em que habita a justiça. Se quisermos ser moradores desta nova realidade, temos que submeter-nos à ação do Espírito, reformatando-nos, tornando-nos cada vez mais parecidos com Jesus.
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