quarta-feira, 12 de março de 2014

O que você pode fazer com o seu fio














Cristo e o labirinto da condição existencial humana


Por Hermes C. Fernandes

Havia um labirinto na antiga Grécia, na ilha de Creta, criado com o intuito de abrigar umas das mais temidas feras do mundo antigo chamada Minotauro: uma criatura com corpo de homem, cabeça de touro e dentes de leão, usados para devorar todos que se aproximam.

A figura do labirinto serve-nos como analogia da condição existencial humana. A proposta religiosa nos oferece uma rota para nos tirar deste emaranhado e nos reencaminhar na direção da fonte onde encontraríamos a resposta para as nossas mais inquietantes indagações. Porém, é ao homem que devemos creditar tal façanha, não a Deus. Toda religião seria iniciativa meramente humana, diferindo da proposta do evangelho que seria uma iniciativa estritamente divina.

Veja o que Deus diz sobre nossas vãs tentativas de nos reaproximar d’Ele em nossos próprios termos:

“O caminho da paz eles não o conhecem, nem há justiça nos seus passos; fizeram para si veredas tortas; todo aquele que anda por elas não tem conhecimento da paz. Pelo que a justiça está longe de nós, e a retidão não nos alcança; esperamos pela luz, e eis que só há trevas; pelo resplendor, mas andamos em escuridão. Apalpamos as paredes como cegos; sim, como os que não têm olhos andamos apalpando; tropeçamos ao meio-dia como no crepúsculo, e entre os vivos somos como mortos.” Isaías 59:8-10

Veredas tortas, escuridão que nos força a andar apalpando as paredes, reforçam a imagem do labirinto que proponho aqui como análoga à religião. Devido à nossa total incompetência em escapar dele, Deus teve que intervir.

A Lei entregue por Deus a Moisés serviu-nos como um mapa dentro desse labirinto, porém, não nos livrou da presença do mal. A cada curva corríamos o risco de nos depararmos com a besta, metade homem, metade fera. Mas por estarmos na escuridão, apenas ouvíamos o seu rugido, como que de um leão buscando a quem pudesse tragar.

A segunda medida tomada por Deus foi enviar-nos profetas cuja luz serviu-nos como lanterna, possibilitando-nos enxergar o que estava logo à nossa frente (2 Pe. 1:19). Foi a partir daí que descobrimos que as paredes desse labirinto eram feitas de espelho, de sorte que o monstro que vimos nada mais era do que nosso próprio reflexo. Estávamos todos encurralados, não importando que direção tomássemos. A cada curva, o monstro reaparecia. Fugir dele era fugir de nós mesmos. Metade humanos, metade monstros. Tal era nossa condição. Sabíamos o bem que tínhamos de fazer, mas a fera em nós era indomável. Talvez a Lei até pudesse nos conduzir ao destino glorioso que se propunha. O problema não estava nela, mas em nós, nas pulsões que habitam nosso ser bipartido. “Miserável homem que sou!”, exclamaria Paulo, “quem me livrará do corpo desta morte?” (Rm.7:24). 

Não foi Teseu, o filho de Egeu quem liquidou o monstro, como na mitologia grega. Foi Jesus, o Filho do Deus vivo quem entrou nesse labirinto e derrotou a besta-fera. Por isso, o mesmo Paulo responde imediatamente à sua pergunta: Dou graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor” (v.25).

Através de Sua cruz, Jesus não apenas liquidou o minotauro que nos assombrava, como também nos abriu um novo e vivo caminho pelo qual temos amplo acesso ao Pai. As paredes do labirinto vieram ao chão. É disso que Paulo fala em sua carta aos Efésios:

“Mas agora em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes perto. Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e, derrubando a parede de separação que estava no meio, na sua carne desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças, para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz, e pela cruz reconciliar ambos com Deus em um corpo, matando com ela as inimizades. E, vindo, ele evangelizou a paz, a vós que estáveis longe, e aos que estavam perto; porque por ele ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito.” Efésios 2:13-18

Chega de curvas oblíquas e de caminhos interditados! Chega de ouvir o eco dos rugidos da besta! Estamos agora percorrendo um caminho reto. A complexidade do labirinto cedeu lugar à simplicidade do Caminho. Sequer precisamos de um mapa para transitá-lo. Basta seguir sempre reto, sem desviar-se nem para a esquerda, nem para a direita. Sua simplicidade é tão evidente que o profeta diz que “até mesmo os loucos, não errarão” (Is.35:8). Imagine soltar um louco num labirinto! Solte-o no caminho, ele certamente encontrará seu destino.

Tal verdade é desconcertante para os que se arrogam o papel de especialistas da religião. Aqueles que se apresentam como portadores do mapa. Que dizem possuir a única arma capaz de liquidar o minotauro.

Apesar do alto custo envolvido na demolição do labirinto, a obstinação humana é tamanha que logo se pôs a reconstruí-lo. São os reconstrutores do labirinto religioso os responsáveis por esta nova Babel que vivemos em nossos dias. Diferente da primeira que se erguia verticalmente, a nova Babel é caracterizada por sua complexidade. Não foi em vão que Paulo declarou temer que “assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia”, tenhamos nosso entendimento corrompido, apartando-nos “da simplicidade e da pureza que há em Cristo” (2 Co.11:3).

Nada mais simples do que um caminho reto, sem curvas e interdições. Nada mais complexo do que um labirinto insinuoso como uma serpente enroscada em torno de si. O que pode, à primeira mão, parecer um atalho ingênuo, na verdade é uma armadilha.

Nenhum parede sequer deve ser poupada. Nada há que se aproveitar do que só serviu para promover alienação e escravidão. Seria como transformar Auschwitz num Jardim de Infância. Que pai se sentiria confortável ao deixar seus filhos estudarem nos mesmos edifícios usados pelos nazistas para torturar e matar os judeus durante a Segunda Guerra Mundial?

Por isso, Jesus foi categórico ao profetizar a demolição completa do templo de Jerusalém. “Não ficará pedra sobre pedra!” O rasgar do véu do templo no momento em que rendeu Seu espírito ao Pai foi o prenúncio do que aconteceria cerca de quarenta anos depois sob a espada romana.

Aquele templo havia se tornado num monumento à religiosidade farisaica e hipócrita que se instalara entre os judeus contemporâneos de Cristo. Sua santidade original houvera sido profanada. E a partir do momento em que o sacrifício de Jesus fora aceito pelo Pai, todo e qualquer sacrifício, bem como todo e qualquer culto que se oferecesse ali seriam nulos. Portanto, o templo se tornara obsoleto.

Uma nova aliança passara a vigorar, em que já não haveria geografias sagradas, nem lugar para a burocracia sacerdotal, mas tão somente o culto racional, aquele oferecido ao Pai “em Espírito e em Verdade”, conforme Jesus.

A Antiga Aliança oferecia um caminho em meio ao labirinto. Mas a Nova Aliança oferece o Caminho sem qualquer labirinto. Com o labirinto implodido, que utilidade teria o velho caminho proposto pelo pacto anterior?

Nossa comunhão com Deus foi reatada. O Minotauro foi liquidado.  Nosso velho homem foi crucificado juntamente com Cristo. Os sacrifícios exigidos pela Lei foram totalmente inutilizados e ofuscados ante o sacrifício vicário de Jesus. Portanto, insistir neles é um insulto ao Espírito da Graça.

Por isso, tenhamos ousadia para entrarmos no santíssimo lugar, pelo sangue de Jesus, pelo caminho que ele nos inaugurou, caminho novo e vivo, através do véu, isto é, da sua carne” (Hb.10:19).

EU SOU MUITO COMPLICADO...


Sim, sei que sou...
Pois prefiro gastar dinheiro num bom jantar com a família toda reunida... do que pelo mesmo valor comprar o que quer que seja...
Porque se posso invisto em memórias, em oportunidades que os que eu amo nunca mais esqueçam, do que dando presentes...
Pois privilegio qualquer momento/eterno... ao invés de interrompe-lo para tirar uma foto...
Porque gosto mais de trabalhar cedo e fazer tudo que seja minha responsabilidade logo... a fim de ter tempo para o que eu aprecio.
Pois meu prazer maior é dar prazer ao invés de buscar o meu prazer...
Porque prefiro perdoar do que ter razão...
Pois aguento muito contra mim, mas não suposto quase nada quando é contra os outros...
Porque prefiro ouvir a pior verdade... do que viver “feliz” em qualquer fantasioso engano...
Pois escolho sempre o que creio ao invés de optar por aquilo que me dá vantagem...
Porque aguento muito mais esperar os atrasados do que fazer quem quer que seja me esperar...
Pois prefiro a solitude serena do que as festas e as agitações...
Porque gosto mais da minha própria companhia do que da companhia dos muitos e indecisos...
Pois andar sozinho me é mais produtivo do que fazer-me acompanhar de distraídos...
Porque aceito muito melhor ser traído do que viver a dor de trair alguém...
Pois acolho a dor sincera melhor do que os festivais das irrealizações...
Porque aprendo mais só do que ouvindo mil opiniões...
Pois não busco adesões, mesmo quando isso faria a minha vida mais fácil...
Porque para mim qualquer leitura bíblica solitária me edifica mais do que uma reunião de mil especulações...
Pois sou cauteloso embora não sinta medo de nada que não seja racional...
Porque só consigo vestir uma roupa que reflita a minha alma, do que possuir grifes caras que não se comuniquem com a minha existencialidade...
Pois abomino fazer compras, apesar de gostar de ver as pessoas felizes com o que de útil tenham adquirido...
Porque não sinto falta de socialização, mesmo que ame ver as pessoas felizes por se encontrarem umas com as outras...
Pois não sei gargalhar, embora ame sorrir...
Porque não consigo sentir inveja de ninguém...
Pois me alegro com a alegria genuína das pessoas até mais do que da minha própria...
Porque encaro a morte com simplicidade, ainda que entenda a dor dos que não conseguem consolar-se...
Pois gosto de gente humilde muito mais facilmente do que aprecio a companhia dos sofisticados...
Porque não creio nas alegrias do mundo...
Pois não venço quando ganho uma disputa, mas apenas quando alguém entende o que tento comunicar...
Porque prefiro ter um lindo e simbólico sonho noturno do que ler um livro de dia...
Pois prefiro dar meios de compreensão para meios filhos ganharem a vida do que deixar-lhes heranças materiais...
Porque leio na mesma Bíblia há quarenta anos, e não a troca por nenhuma nova impressão de texto...
Pois amo abrir portas para os outros muito mais do que abrir portas para mim mesmo...
Porque quanto mais abro mão, mas enxergo minhas mãos fechadas...
Pois amo saber que alguns entenderam... do que viver da adulação de multidões que nada compreendem...
Porque se me dissessem que o mundo iria acabar hoje... ainda assim esperaria o final de olhos bem abertos...
E por um bilhão de outras coisas... sei que sou esquisito.
Sim, por muitas outras razões é que sei que sou quase totalmente inadequado ao que todos chamam de sadio e de normal...
Ora, é tão grande a minha anormalidade que é melhor eu parar por aqui...

Nele, em Quem busco ser... embora eu seja apenas como sou, ainda que Nele me perceba crescendo todos os dias,

Caio