sábado, 30 de março de 2013

O beijo de Fernanda ou o beijo de Judas?


Por Hermes C. Fernandes

Muita gente incomodada com o beijo que a atriz Fernanda Montenegro, de 83 anos, deu na boca da atriz Camila Amado, de 77, em protesto contra a permanência do deputado e pastor Marco Feliciano à frente da CDH. O beijo aconteceu durante a 7ª edição do Prêmio APTR (Associação dos Produtores de Teatro do Rio), na noite do dia 25 de março. Alguns chegaram a protestar nas redes sociais. De repente, a rainha do teatro brasileiro foi considerada inimiga mortal da moral cristã e dos bons costumes. Uma carreira de mais de 60 anos jogada no lixo por causa de um beijo! Quem mandou mexer com o povo evangélico! Prepare-se para ser execrada até que este episódio caia no esquecimento. Crucificamos a Xuxa e agora vamos apedrejar a protagonista do “Central do Brasil”.

Sinceramente, sinto-me muito mais incomodado, e até enojado, com o "beijo de Judas" de alguns que se dizem representantes do povo evangélico. Traem Seu Mestre em nome de uma agenda política e ideológica. Escandalizo-me cada vez que vejo um político cristão de mãos dadas com o que há de pior naquele meio, traindo seus próprios eleitores, e, pior, traindo suas convicções religiosas que tanto afirmam defender. Poupam a moral, mas traem a ética. O que expressa nossa histórica mania de coar mosquitos e fazer gargarejo com dromedários.

Incomoda-me muito mais os pecados dos de dentro, dos que, em tese, conhecem a verdade, do que os daqueles que desconhecem as demandas do evangelho.

Com isso, não estou abonando o gesto de Fernanda Montenegro, mas apenas conclamando a meus irmãos à consciência, a fim de que deixemos de apontar o cisco no olho dos outros, enquanto trazemos uma trave atravessada no nosso.

Vergonha para nós! Que tipo de políticos temos produzido! São a nossa cara! Frutos de púlpitos despreparados, de sermões vazios, de discursos superficiais. 

A bem da verdade, o que nos incomoda não é o beijo em si. Hebe Camargo vivia distribuindo selinhos em homens e mulheres, ninguém jamais se importou. O problema é o que se pretendeu dizer através do tal beijo. A igreja que antes produziu gente da estirpe de Martin Luther King, Jr., agora produz pregadores/políticos que afirmam haver uma maldição sobre determinada etnia, e chamam de privilégios desnecessários os direitos pleiteados por homossexuais. Aquele "beijo" expôs nossas entranhas...

Aplaudo a coragem de Fernanda ao expor sua reputação em nome daquilo em que acredita (mesmo que não coincida com aquilo em que temos acreditado). Uma carreira brilhante e uma história que inclui um casamento que durou mais de cinquenta anos (o que é raro entre os artistas) não podem ser desprezados por causa de um beijo que não passou de uma encenação em protesto contra o que, a seu ver, ameaça o interesse de minorias, dentre as quais os negros e homoafetivos. 

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