quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Amor sem proselitismo e outras intenções


Por Hermes C. Fernandes

Deus não nos enviou ao mundo para convertê-lo, mas para amá-lo. Conversão são outros quinhentos  e não cabe a nenhum de nós. Achar-se capaz de converter o mundo beira à presunção.

O amor deve ser totalmente despretensioso, entregando-se voluntariamente sem esperar resultado algum. De modo que, se não formos correspondidos, isso não nos afetará. Nem mesmo a ingratidão nos fará desistir de amar. O alvo supremo do amor sempre é o bem de quem se ama.  

Qualquer coisa que se faz na expectativa de algum retorno não é amor, mas barganha, e, portanto, contrário ao espírito do evangelho.

Muitas igrejas têm promovido trabalhos sociais dignos de louvor. Todavia, o índice de frustração é muito grande, pois os mesmos não vêm acompanhados de resultados considerados satisfatórios.

A meu ver, precisamos rever nossos paradigmas.

Aproveitar a dor alheia para empurrar nossa visão religiosa não é evangelismo, mas proselitismo, do tipo adotado pelos fariseus; em vez de alívio, agrava o sofrimento, tornando-o insuportável. Jesus os advertiu, dizendo: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito; e, depois de o terdes feito, o fazeis filho do inferno duas vezes mais do que vós” (Mt. 23:15).

Nosso modelo de evangelização ainda está atrelado à visão colonialista europeia. Nossa abordagem está contaminada pela presunção de que temos algo que os outros não têm. Somos os civilizados, e eles, os selvagens. Somos os cristãos, e eles, os pagãos. Temos Cristo, eles não.

Oferecemos ajuda humanitária como uma moeda de troca, exatamente como os espanhóis e portugueses faziam com os índios ao oferecer-lhes bugigangas tais como espelhos e pentes.

É claro que almejamos compartilhar Cristo ao maior número possível de pessoas. Todavia, antes disso, devemos compartilhar nossa própria alma de maneira despretensiosa (1 Ts.2:8).  

Por conta do forte proselitismo de algumas igrejas e instituições cristãs, as pessoas já estão escaldadas. Qualquer aproximação é vista com suspeita. Nossas obras sociais e humanitárias se tornaram a isca que camufla o anzol.

Jesus disse que faria de Pedro e André pescadores de homens. Todavia, o tipo de pesca que eles faziam era com rede e não com vara. Portanto, dispensava o uso de iscas.

Será que a intenção de Jesus ao multiplicar aqueles pães e peixes era meramente proselitista? Então, por que não houve um “apelo evangelístico” após alimentar a multidão?

E quando a igreja em Jerusalém resolveu assumir os cuidados das viúvas da comunidade, elegendo diáconos para dedicar-se a esse “importante negócio”, havia alguma intenção “evangelística”? Ou teriam sido movidos exclusivamente por amor?

Alguns poderão contestar dizendo: Se amamos as pessoas, queremos vê-las salvas. Concordo! Mas não me parece ético se aproveitar de uma necessidade material ou emocional para apresentar o evangelho. Seria mais ou menos como um político cheio de boas intenções oferecendo dentaduras e botijões de gás para quem lhe der o voto.

Repito: precisamos rever nossos paradigmas.

Quero propor aqui uma abordagem diferente.  Em vez de presumir que levaremos Deus a eles, nossa visão será a de buscar Deus neles.

Haveria algum embasamento bíblico para isso?

Jesus disse que no último dia seríamos julgados pelo bem que houvéssemos feito a Ele próprio, isto é, pela comida com que O alimentamos, a roupa com que cobrimos Sua nudez, a visita que Lhe fizemos na cadeia, etc. E quando perguntássemos quando tais coisas teriam ocorrido, Ele responderia: Quando fizeram a um dos meus pequeninos.

Engana-se quem pensa encontrar Cristo na suntuosidade das catedrais. Ele está à nossa espera sob as marquises e pontes dos grandes centros urbanos, nas cadeias superlotadas, nos lixões e bolsões de miséria.
Em outras palavras, aquele gente sofrida tem muito mais a nos oferecer do que nós a ela. Seu sorriso é o sorriso de Cristo. Abraçá-la é sentir o calor dos braços d’Aquele a quem servimos.

Antes de querer convertê-los a Cristo, devemos descer de nosso pedestal religioso e converter-nos a eles.
O tipo de amor que devemos dispensar-lhes é aquele esboçado por Paulo ao declarar: “Eu de muito boa vontade gastarei, e me deixarei gastar pelas vossas almas, ainda que, amando-vos cada vez mais, seja menos amado” (2 Coríntios 12:15).

Não espere resultados! Apenas, ame. Gaste-se. Doe-se. Entregue-se por inteiro. E tudo isso só será possível onde houver a morte do nosso eu com todas as suas pretensões e presunções. Somente aí o fruto virá. Jesus diz que “se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto” (João 12:24). Talvez esta seja a razão pela qual os frutos têm sido escassos. O grão tem caído na terra, mas não tem morrido. Temos amado, mas quando não somos devidamente correspondidos, sentimo-nos frustrados e desistimos de amar.


Para reverter isso, a única saída é a cruz. Nosso “eu” não merece outro tratamento senão a morte. Então, o fruto virá em abundância. Colheitas ocorrerão naturalmente, sem que tenhamos que recorrer a expedientes mirabolantes. Deixemos nossas estratégias marqueteiras. Façamos com a mão direita sem que a esquerda tome conhecimento. Sejamos movidos exclusivamente por amor e não por interesses, ainda que os mais nobres.  O máximo que conseguiremos através de nossas estratégias serão adesões. Entretanto, os frutos não permanecerão. Deixemos por conta d’Ele aquilo que só Ele é capaz de produzir: verdadeiras conversões. Quanto a nós, amemos... não só com palavras, mas de fato

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