domingo, 4 de maio de 2014

Um Deus Operário e a "maldição" do trabalho


Por Hermes C. Fernandes


Hoje se celebra o Dia do Trabalho. E para muitos, não haveria melhor maneira de se comemorar do que tirando um dia de folga. Quem gostaria de passar o Dia do Trabalho trabalhando? Principalmente quando se tem a oportunidade de emendar num feriado prolongado... 

Fica a impressão de que trabalho seja um mal necessário, uma espécie de maldição. Daí, a ojeriza que temos pela segunda-feira e o anseio para que chegue logo a sexta-feira.  O sonho de muitos é ganhar na loteria para nunca mais ter que trabalhar. Consideramos bem-aventurado quem ganhe muito trabalhando pouco. 

Há até quem busque justificar tal postura com sua teologia. Estes entendem que o trabalho foi instituído por Deus como uma maldição decorrida do pecado. "Do suor do teu rosto comerás..." Ledo engano! Mesmo antes do episódio conhecido como Queda, Deus destacou o primeiro homem para que cultivasse o seu jardim. Portanto, o Jardim do Éden, ou jardim dos prazeres, também era o jardim do labor. Bem-aventurado é quem descobre no trabalho o prazer da vida. 

Se trabalho é maldição, logo, o Deus revelado em Cristo seria um deus amaldiçoado. Veja o testemunho dado por Jesus acerca de Seu Pai:
"Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também." João 5:17
O que torna o trabalho algo penoso ou prazeroso é o seu propósito. A pergunta que deveríamos nos fazer é: pelo que trabalhamos? Ironicamente, se trabalhamos visando unicamente nosso aprazimento, o trabalho se torna um tormento. Mas quando trabalhamos visando o bem comum e a glória de Deus, sentimo-nos realizados e plenamente satisfeitos pelo fruto de nosso labor. Em outras palavras, o que dignifica o trabalho é o amor. Isaías profetiza que Jesus "verá o fruto do trabalho de sua alma, e ficará satisfeito" (Is.53:11). E qual seria o tal fruto do Seu trabalho? A redenção da humanidade e a restauração de toda a criação. Portanto, o que motivou o Seu árduo trabalho foi o amor. 

Semelhantemente, o Pai trabalha visando o bem dos que ama. Como testifica o mesmo profeta Isaías, "desde a antiguidade não se ouviu, nem com os ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu um Deus além de ti que trabalha para aquele que nele esperar" (Is.64:4). Quem diria? O Deus dos cristãos é um Deus Operário. Ele trabalha até no turno da noite! "Aos seus amados, Ele dá enquanto dormem"(Sl.127:2b).

Sabemos que "em todo trabalho há proveito" (Pv.14:23), todavia, o trabalhador não deve ser o único a se beneficiar de seu labuto. Como discípulo do Pai e do Filho, impulsionado pelo Espírito, requer-se do verdadeiro cristão que "trabalhe, fazendo com as mãos o que é bom, para que tenha o que repartir com o que tiver necessidade" (Ef.4:28). 

Isso não quer dizer que não se possa usufruir dos frutos do próprio trabalho. Pelo contrário. A Escritura declara que "o lavrador que trabalha deve ser o primeiro a gozar dos frutos" (2 Tm.2:6), e que sem qualquer sentimento de culpa, "todo homem coma e beba, e goze do bem de todo o seu trabalho; isto é um dom de Deus" (Ec.3:13).

O que deveríamos considerar uma maldição é a ociosidade. Por isso, Cristo adverte aos Seus discípulos: "Negociai até que eu venha"(Lc.19:13). A palavra "negócio" é a junção de duas outras palavras: negar + ócio. Portanto, trabalhar é negociar, isto é, negar o ócio, descruzar os braços, buscar o que fazer. Pode até ser que falte emprego, mas jamais faltará trabalho. 

Quem se recusa a trabalhar, sente-se no direito de ser pesado aos demais. Desde os primórdios da igreja, alguns quiseram se aproveitar daquele clima de solidariedade em que todos repartiam entre si, e com isso, recusavam-se a trabalhar. Paulo teve que cortar um dobrado com esse espertalhões. A ordem apostólica era: "Se alguém não quer trabalhar, também não coma" (2 Ts.3:10).

Uma coisa é não trabalhar por razões contrárias à vontade, tais como falta de oportunidade, doença, injustiça, etc. Outra coisa é não querer trabalhar. Ninguém tem o direito de ser pesado aos demais. Paulo dá testemunho acerca da postura que ele mesmo adotou no afã de ser exemplo para os demais:
"Nem de graça comemos o pão de homem algum, mas com trabalho e fadiga, trabalhando noite e dia, para não sermos pesados a nenhum de vós." 2 Tessalonicenses 3:8
Outra coisa que Deus abomina é a exploração do trabalho alheio. Paulo dá eco ao princípio ensinado por Jesus: "O trabalhador é digno do seu salário" ( 1 Tm.5:18; Lc.10:7).

Assim como há quem queira receber sem trabalhar, também há que queira tirar vantagem do trabalho de outros. Há duas severas admoestação para os tais, uma extraída do Antigo e outra do Novo Testamento:

"Ai daquele que edifica a sua casa com iniquidade, e os seus aposentos com injustiça; que se serve do trabalho do seu próximo sem remunerá-lo, e não lhe dá o salário." Jeremias 22:13 
"Eis que o salário que fraudulentamente retivestes aos trabalhadores que ceifaram os vossos campos clama, e os clamores dos ceifeiros têm chegado aos ouvidos do Senhor dos Exércitos." Tiago 5:4 
Deus não viola Seus próprios princípios. Quem se atreve a burlá-los certamente terá consequência. Assim como queremos que nosso trabalho seja valorizado, recebendo o que for justo, devemos valorizar o trabalho dos outros, pagando-os de acordo com o que for justo e honesto.

No Reino de Deus, ninguém precisa perder para que outro ganhe. Onde impera a justiça, ali há paz. E onde houver paz, ali haverá alegria.

Feliz Dia do Trabalho a todos!

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